Sobre Terapia Familiar

As relações próximas são essenciais ao nosso bem-estar, qualidade de vida e saúde mental. Como dizia John Donne, “nenhum homem é uma ilha”, ou seja, estamos intimamente ligados e dependentes uns dos outros. Os laços familiares são os mais importantes no início de vida e durante a infância. A família é o nosso primeiro ponto de contacto com o mundo e é com ela que aprendemos a ser e a estar com os outros. Ao longo da vida, vamos formando outras relações próximas, novas famílias. Vamos também vivendo desafios, uns que superamos naturalmente e outros mais difíceis e inesperados que nos deixam o mundo do avesso, como a doença, o luto, o divórcio, ou a perda de emprego. 

O que é a terapia familiar e como pode ajudar?

A terapia familiar desenvolveu-se nos anos 50 por um grupo de investigadores nos EUA que estudava como a esquizofrenia afectava a vida familiar. Nos últimos 60 anos surgiram novas teorias e métodos e também inúmeros estudos a comprovar a sua eficácia para vários problemas. A terapia familiar pode ajudar nas dificuldades nas relações de casal, entre pais e crianças ou entre outros familiares. Pode ser útil numa crise familiar que causa stress, perda ou conflito, quando há discórdia parental, problemas financeiros ou em casos de diagnóstico de uma doença ou perturbação mental. Nestas situações, o problema de um é também um problema de todos. Os objectivos da terapia são dar voz a todos os membros da família, melhorar a comunicação para aproximar a família, explorar os recursos já existentes na família para lidar com o problema e descobrir novas soluções. Muitas famílias relatam benefícios mesmo após concluir a terapia, já que se sentem mais capazes e resilientes quando surgem novos problemas. 

Qual o significado de família em terapia familiar?

O conceito de “família” em terapia familiar é abrangente e refere-se a um grupo de pessoas unido por relações de afecto ou parentesco. Além de pais e crianças de todas as idades, pode incluir também a família extensa (como avós, irmãos, tios e primos) e também amigos, profissionais ou qualquer pessoa que seja considerada importante para a família.

Quais os problemas ou condições que a terapia familiar pode tratar?

Neste momento há estudos suficientes sobre a eficácia da terapia familiar para as seguintes dificuldades: 

  • Dificuldades nas relações de casal ou família
  • Anorexia, Bulimia Nervosa e outras perturbações alimentares 
  • Dificuldades de comportamento de crianças ou adolescentes e dificuldades relacionadas com as práticas parentais
  • Famílias em que há problemas de alcoolismo, perturbações mentais ou outras doenças, conflito e trauma. 
  • Dificuldades relacionadas com o processo de acolhimento ou adopção de crianças
  • Casais em processo de separação ou divórcio que querem focar-se no bem-estar e necessidades das crianças. 
  • Dificuldades relacionadas com uma determinada fase do ciclo de desenvolvimento (por exemplo, sair de casa, iniciar a reforma, etc).

É possível combinar terapia familiar com outros tratamentos psicológicos?

Sim, claro. Por exemplo, no caso de abuso de substâncias ou perturbações psicóticas, é essencial que a pessoa continue com terapia individual, medicação ou programa de reabilitação. Nestas situações ter também terapia familiar pode ajudar a família a perceber e a lidar melhor com os efeitos da doença.

O que acontece nas sessões de terapia familiar? 

Em terapia familiar trabalha-se “com” a família e não “na” família, ou seja a terapia é um processo colaborativo. Sempre que possível, é importante incluir todos os membros da família ou casal. Uma das grandes vantagens da terapia familiar é que todos podem contar a sua história e partilhar as suas ideias. O terapeuta familiar tem experiência em gerir as dinâmicas de grupo e a encorajar todos a colaborar na sessão, incluindo as crianças. As perguntas e actividades propostas são sempre de acordo com a idade. Além de facilitar a discussão sobre os desafios e os problemas, o terapeuta centra-se também nos pontos fortes de cada família.

Qual é a duração e frequência da terapia familiar?

A duração da terapia familiar varia consoante cada caso e depende de diversos factores, mas após a primeira avaliação é possível ter uma ideia do quantas sessões serão necessárias. Por norma, recomendo 6 sessões semanais + uma sessão de revisão e feedback para re-avaliar o plano e delinear os passos seguintes. Às vezes é importante dar continuidade às sessões semanais, outras vezes posso sugerir espaçar as sessões para uma frequência quinzenal ou a cada 3 semanas (para centrar a aprendizagem fora das sessões), ou recomendar uma sessão de follow-up após uns meses para ver o ponto da situação mais tarde. Por vezes é útil também fazer algumas sessões individuais com cada membro do casal ou família além das sessões conjuntas. A duração de cada sessão é de 1 hora.  

E se algumas pessoas na família não quiserem participar em terapia familiar?

Uma forma de convidar um membro da família a participar nas sessões é dizer algo como: “Estou preocupado/a com a situação X. Eu e … (incluir nomes dos participantes) começamos a ir a sessões de terapia familiar e gostaríamos que participasses também. O terapeuta diz que é importante ouvir a opinião de todos e nós gostaríamos de ouvir as tuas ideias”. Se a família estiver de acordo, o terapeuta pode também telefonar aos membros ausentes para responder a todas as perguntas ou dúvidas antes da sessão. 

É possível ter sessões individuais?

Sim, é possível. No fundo, o trabalho é idêntico já que a terapia procede tendo em conta o contexto relacional do indivíduo. A terapia familiar parte do princípio de que qualquer mudança a nível individual terá impacto nos vários contextos e grupos. Por vezes é benéfico ter algumas sessões individuais durante ou após concluir terapia familiar. Em situações de alguma hostilidade e conflito na relação entre adolescente e pais, é habitual alternar sessões individuais com adolescentes e pais antes de iniciar terapia familiar. 

E quando se chega ao fim da terapia?

O fim da terapia é algo que o terapeuta vai abordar desde o início das sessões e ao longo do processo terapêutico. Chegar ao fim do processo terapêutico é uma etapa importante e portanto a data da última sessão deve ser planeada entre o terapeuta e o casal ou família nas sessões.

REFERÊNCIA:

Stratton, P. (2016). The evidence base of family therapy and systemic practice. Association for Family Therapy, UK.